Certa vez, quando era pequeno, resolvi fazer uma espécie de “mapa” do meu cérebro. Para mim, a mente era como um grande arquivo, cheio de gavetas abarrotadas de papéis contendo muitas e muitas informações. Na época, resolvi separar essa papelada em seções, organizadas de acordo com as atividades que eu precisava realizar (mas as tarefas infantis eram simples: fazer o dever de casa, jogar videogame, arrumar o quarto de vez em quando, jogar bola com os amigos). Dificuldade alguma, não é mesmo?
Hoje percebo que as coisas não são tão simples e que a nossa mente não pode ser tão facilmente organizada (só enquanto bato este texto no computador, mil pensamentos pululam na minha cabeça!). Quem dera ainda ter um olhar infantil sobre o mundo, acreditar em tudo que me diziam e não saber de nada... Infelizmente, não é assim que acontece. À medida que fico mais velho (tudo bem, “velho” é hipérbole), aumentam minhas experiências, sonhos e idéias malucas. E aquelas poucas folhas escritas (a maioria ainda em branco) vão se transformando em tantas que, quando olho, nem sei mais em que gaveta enfiar. Preciso de tempo e de paciência para pôr tudo no seu devido lugar, organizar meus pensamentos...
Colocar no lugar? Mas pra quê? Não vai ter ninguém vendo mesmo... Entretanto, talvez seja bom dar uma revisada em tanta informação, analisar os pontos positivos e negativos da minha vida.
Começo, então, a remexer nas minhas gavetas (as que consigo alcançar, pois algumas devem estar tão inacessíveis que apenas meu inconsciente será capaz de atingir). Vou abrindo-as, vou revivendo minha história, apenas minha, única, pois sei que ninguém é capaz de viver por mim, de controlar minha imaginação, de falar por mim! Eis que, conforme avanço nas profundezas do meu cérebro, lembro de que nem tudo são flores. Abri gavetas que não gostaria de ter aberto; outras, tento, em vão, fechar. Algumas eu nem recordava que estavam lá e, caramba... uma surpresa agradável, uma lembrança boa!
Talvez eu precise da ajuda de meus amigos ou de minha família para abrir, fechar ou procurar determinadas gavetas. De qualquer forma, é sempre bom ter alguém com quem se possa contar. Apesar de saber que sou o protagonista da minha vida, não posso construí-la sozinho.
Minha mente fervilha de pensamentos. Como já disse, não é fácil pôr tudo em ordem. Às vezes, o momento pelo qual passo parece formar um furacão que tenta acabar com qualquer possibilidade de organizar meu arquivo. Tantos papéis espalhados, uma confusão...
Como dizem, “após a tempestade vem a bonança”. Tenho mais uma oportunidade de colocar minhas idéias no lugar. Não vou reclamar de ter todo esse trabalho de novo. Pensando bem, que graça teria minha vida se tudo fosse uma utopia, se meus arquivos estivessem sempre em ordem? Que lugar teriam as emoções na minha alma? O que me ajudaria a crescer, a tornar-me mais forte, a sorrir quando os outros sentem prazer em assistir minha lamentação?
Minhas preocupações de criança já se foram, minha jornada sem volta para o mundo real já começou. O que fazer então? Agradeço a Deus pela oportunidade de continuar. Melhor se arriscar na aventura do viver do que ver meu corpo num caixão sendo devorado pelos vermes da terra. Que bom que bagunço minhas gavetas! Que bom ter a chance de rever tudo pelo que já passei, de procurar aprender com meus erros, de me descobrir, de inventar maneiras de ser mais feliz, enfim... de não deixar as minhas experiências se transformarem num “arquivo-morto”!
(Danillo Barros)